"Creio no Cinema, arte muda, filha da Imagem, elemento original de poesia e plástica infinitas, célula simples de duração efémera e livremente multiplicável. (...) Creio no Cinema puro, branco e preto, linguagem universal de alto valor sugestivo, rico na liberdade e poder de evocação. Creio nesse Cinema. Em qualquer outro, o que transige com o som, a palavra, a cor, não posso e não quero crer."
Vinicius de Morais, Credo e Alarme, 1941
Tenho vindo a ler nos últimos dias uma série de crónicas e criticas de cinema escritas pelo poeta Vinicius de Moraes para algumas publicações brasileiras como o jornal A Manhã entre 1941 e 1953. Constatei com curiosidade que Vinicius de Moraes, cinéfilo acérrimo, era na verdade um, digamos, "purista" do Cinema, isto é, um defensor do cinema puro; mudo e a preto e branco. Para Moraes, o som e a cor roubavam ao cinema tudo que este tinha de poético e crucificava o technicolor, a MGM, o star system e muito do que era a produção oriunda do "bosque sagrado" com um elegantíssimo desprezo.
Não pude deixar de pensar na aversão de muita da critica contemporânea (e muitas vezes, minha também) ao uso (e abuso) de novas tecnologias como o CGI e o 3D, pelas mesmas razões que apoquentavam o poeta brasileiro.
Acredito que se olharmos para as coisas com uma perspectiva histórica, é mais fácil compreender a forma como as novas tecnologias são introduzidas na produção cinematográfica, passando sempre por uma fase de novidade e deslumbramento que é, geralmente, medonha.
Se quando o som surgiu desatava tudo a cantar de 5 em 5 minutos e se quando a cor surgiu os cenários e figurinos eram coisa para causar ataques de epilepsia em muito boa gente, é natural que a fase de novidade dos efeitos especiais computorizados vá pecar por hipérbole, em tentativas sôfregas de explorar estes meios até aos seus limites, ou digamos, aos limites do ridículo. E claro, tal como nos filmes que Vinicius trucidava nos seus textos, o que fica para segundo plano é sempre a história.
É preciso dar às coisas a importância que elas têm.
Com o passar dos anos, o cinema aprendeu a usar a cor e o som com contenção, e a comédia musical liberou a tecnologia para que outros géneros, como o drama, a pudessem também usar. Hoje em dia, tirando pontuais casos que se servem do preto e branco para cumprir um propósito artístico - ou contornar limitações financeiras, todos os filmes são a cores, sem que a intensidade dramática da história seja comprometida por isso (salvo as excepções, claro). A sensatez de usar uma tecnologia de forma subtil é resultado de muita experiência uma ou outra década de tentativa-erro, acabando por se integrar naturalmente na experiência cinematográfica.

2 comentários:
Muito bem escrito...para não variar.
kss
myfashion-notes.blogspot.com
A ver vamos no que vai dar esta nova moda...
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